domingo, 6 de dezembro de 2009

O olhar do amazônida para o céu: mais respeito ao sagrado



É próprio de todas as espécies preparar gerações futuras transmitindo e apreendendo conhecimentos e comportamentos acumulados pelas gerações anteriores. Ubiratan D’Ambrósio.

Foi essa idéia que me deu vazão à criação e implantação do Planetário do Pará. Desde que fui convidada em 1997 pela UEPA (Universidade do Estado do Pará) a elaborar um projeto para a instalação do Planetário do Pará, me veio o desejo de não só ser um centro de difusão do conhecimento, mas, valorização do povo amazônida que habita cada metro quadrado desta terra. Quantos saberes por aí existem, diante do princípio da etnopedagogia (clique nos links para saber mais), com base em Ubiratan D’Ambrósio, resolvi ler mais ainda sobre ecopedagogia, Francisco Gutiérrez-Paulo Freire e Fritjof Capra, percebi interfaces com Edgar Morin, sobre complexidade na educação, e Ilya Prigogine, pela teoria das estruturas dissipativas que nos levam a repensar o papel do nosso tempo, a nossa visão sobre o conhecimento, sobre as leis fundamentais da física que buscam explicar o universo e o fim das certezas. Foi um pulo para conhecer mais de perto Maturana e Varela e entrelaçar realidades, poesia, ciência, cultura e história.

O que eu quero dizer com tudo isso, havia sim muita sabedoria desde os povos primitivos que percebiam as relações de mútuo pertencimento entre a natureza humana e o meio e, de modo interdependente, a dimensão da vida. Naturezas e relações aprendem a lidar com o que é mais sagrado a todos: A VIDA.

Povos indígenas, pescadores, mateiros, ribeirinhos, quilombolas, enfim, todos os que sabem ler o céu, suas estrelas, seus pontos escuros, a luz do sol, a luz da lua e demais fenômenos celestes e o tanto que influenciam em nosso ser, existir, co-existir, transcender-se.

Todos se encantaram com a proposta da etnoastronomia - do Planetário de Porto Alegre ao de Fortaleza - esse daqui seria o primeiro das terras amazônidas. Ainda é. A idéia tranpôs as fronteiras brasileiras e encantou muitos outros países e além do território das Américas. Tudo se deve ao reconhecimento da identidade indígena a partir dos Tembé, quanta semelhança com o povo babilônico. Olhar histórico, sabedoria da mata, dos rios, dos céus se entrecruzavam. Apresentarei devagarinho essa história.

Todos os que chamei para compor a equipe saíram ganhando com os conhecimento da etnopedagogia, este lugar proporcionou muitos vôos científicos, hoje estão constituídos no mundo acadêmico e com titularidades reconhecidas.

Viva Ubiratan D’Ambrósio, através dele adquiri coragem para propor algo enquanto pedagoga em um terreno das ciências exatas e específico da astronomia, sobretudo, agradeço a oportunidade dada pela UEPA. Ganhamos o projeto e com ele o primeiro lugar do Prêmio Jabuti em 2000, na categoria dos didáticos. Na ocasião que recebi o Jabuti ironicamente eu já estava afastada do lugar idealizado e que acompanhava, desde 1997, a promessa de valorização do povo dessas terras paraoaras. As riquezas daqui enriquecem as gentes de outros rincões.

E OS TEMBÉ? E as crianças que a matriarca da aldeia – a capitoa Verônica – muito preocupada com o fato de que elas falam mais o português que o seu dialeto original? Ela me pediu, quando em visita ao Planetário na véspera da sua inauguração, em 30 de setembro 1999, que fizéssemos uma cartilha para resgatar o orgulho, o conhecimento de suas crianças e não ao contrário divulgar saberes aos filhos do branco. Ela tem sua razão, as pesquisas devem ser daqui para eles, e não somente deles para nós. Via única. A minoria necessita ser respeitada em seu território. Porém, a minha promessa ficou no ar, pois, logo em seguida sai de lá, e hoje ainda me ressinto dessa não realização.

O que fazer se a política nesse país muda os rumos dos educadores?

Silencio-me, mas,
não calo na boca notícia ruim. A utopia se faz necessária para viver. É a educação ambiental na alma que reclama e proclama relações de interdependência. Respeito é a palavra da hora.

Apresento a vocês a constelação do "queixo da anta" (Tapi'i Hazywer), que está localizada na mesma região das setes irmãs (as Plêiades - surge no equinócio da primavera). Lá está a estrela aldebaran, que também pertence à constelação do Touro, primeira constgelação criada pelos babilônios (4.000 anos a.C.). E assim os Tembé vivem a "escola da vida". Essa sabedoria casou com o conhecimento etnoarqueoastronômico do professor Germano Bruno Afonso, que foi o nosso consultor e adentrou a aldeia dos Tembé, por fim propus o desafio de elaborarmos o relatório de campo através de uma cartilha para crianças, linguagem clara e consubstanciada de conhecimentos etnopedagógicos com base em piagetiana (cognição) e vigotskiana (mediação). A equipe coordenada por mim entusiasmou-se.


"Nós os índios, sempre cantamos e dançamos nas nossas cantorias, como forma de manter a unidade do nosso povo e a alegria da comunidade. Se a gente cantar e dançar, nós nunca vamos acabar" (Verônica Tembé, Capitoa da Aldeia Tekohaw).

Para saber mais acesse: Mitos e Estações no Céu Tupi-Guarani.

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